30 novembro 2013

sesta desperta no boteco

ouvido: band fm.
nariz: bicho morto na frigideira longe.
nariz: barata invisível arrodiando pés.

o bueiro da rua arrota.

dentro de mim, 
teus olhos me cochichando carinho
teu cheiro me molhando,
me deixando de pau duro.

e as palavras são corpos,
e o tédio, daquele mais mais fundo, vira as costas.

22 outubro 2013


eu e a lua grande
trepando no quintal

cachorra veio
me beijou
e saiu.

19 outubro 2013

Tanabi, tá na bosta

Arroz branco, brócolis, proteína de soja com tomate, refogado de berinjela. Na mão direita, uma faca. A faca no punho esquerdo. Riscos. O coração cansado desse mundo. O corpo caindo numa cama de espetos. A cabeça doendo. Cabeça pequena pra tantas dores no mundo. O estômago é um emaranhado de opressões engolidas, repressões, punições, padronizações, definições, binarismos de gênero. Um trem passando demoradamente sobre tudo isso, bem em frente àquela estação abandonada. Um ácido derretendo esse corpo todo. Fogueira a céu aberto fazendo cinzas das coisas-coisas que não cabem na mochila e aprisionam. O corpo queimando junto. Sim, eu luto, luto, luto, luto todos o dias, o tempo todo, Utopia & Paixão: A Política do Cotidiano. Mas é difícil olhar ao redor e ver uma cidade que repudia o prazer e a alegria, que celebra o sofrimento e o trabalho, maldita cruz sobre este mundo, uma família que me vê como propriedade, família, essa instituição capitalista. Não fosse a cachorra, eu já estaria vagueando por aí, bem longe daqui. Mas não fosse a cachorra, talvez eu nem existisse hoje. 

07 outubro 2013

09 agosto 2013

belos horizontes

E foi depois de muitos voos que percebi que posso ser mais leve ou mais pesada que o ar. Só depende do quanto de ar boto dentro de mim, do quanto de ar deixo sair, naquele espaço de tempo em que olho os caminhos iluminados lá embaixo pelas luzinhas em multidão. 

Foi depois de muito tempo que percebi que posso ser ar.

06 agosto 2013

partidas

em meio ao velório do avô
abraçou distraída o amigo viajante
que partiria dali naquela tarde
(e depois para além-mar)
respirou fundo três vezes
(o abraço comprimindo-lhe o peito)
sentiu a quentura descendo pra calcinha.

fosse em outro lugar 

lhe botaria a mão na poça quente, mão sobre mão
sendo ali, colou os lábios aos dele
sugando o ar como se fosse fumaça amaconhada
esgueirou-se para o ouvido esquerdo e
no compasso da respiração vagarosa
sussurrou:

 preciso de você dentro de mim agora.

24 junho 2013

sapato do gigante

tentava botar fogo
numa folha seca
de coqueiro

veio um sapato social 
grande, lustroso

do gigante

que do alto da 
camisa branca engomada
empunhava um 
picolé.