18 dezembro 2009

Meia página

.....Com sono e um livro que se repete, a leitura não prossegue.
.....Desesperada, percebo que não mais consigo escrever em prosa. Vejo as palavras se enfileirando em versos; letra por letra a passear pela página.
.....Preciso ler o livro, preciso de um café. Preciso conseguir escrever frases que vão de uma margem à outra. O café acabou; a máquina só cospe leite com chocolate. Meu ombro dói, a biblioteca vai fechar, a linha já acabou e o café também. Meu ombro continua a doer. Estou grávida da cabeça; sinto chutes de muitas pernas que embaralham meus olhos e o sutiã aperta meu peito. Talvez esteja com gases. Tenho que continuar escrevendo para completar ao menos meia página. Acho que vou parar de tomar o antidepressivo e beber para escrever e esquecer algumas linhas. O cara ao lado é um chato que fala e fala alto. Lembro que tinha vontade de juntar conversas de mesa ao lado; agora penso no ritmo: um amontoado de frases desconexas. Muitas pessoas chatas. Bocejo, quero minha cama, narro, descrevo, amontoo, doo, sonho, durmo, acordo, escarro, enumero. Dores, dolores, odores, quantas são, quantas foram? Não foram ou não, ainda vão ou irão. Penso e peno, gatos, cachorros, trabalhos, tremores, mais dores. Sexo, trepadas, libertinagem... tudo por aí. Recato, sou a neta mais certinha, a única que salva. Para que desapontá-los? E agora, como continuar? Quem sabe uma massagem e uns afrodisíacos. Ou ficar de meias. Tecer teias, caçar minhocas, jogar birocas. Dançar, nadar, respirar.
.....Respirar.

*outubro 2009

Um comentário: